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É em volta da mesa que muitos dos melhores momentos que a gente vive ficam guardados em alguma caixinha da memória. O sabor, o cheiro, a mão de alguém na sua pela primeira vez. A cada almoço, a cada jantar, a mesa pode ser um país desconhecido onde quem chega nunca sabe ao certo o que vai encontrar.

Mesa lembra comida de vó e de mãe. E, agora que a cozinha deixou de ser território exclusivo das mulheres – muitas só pisavam lá por obrigação, diga-se –, a mesa também já está lembrando comida de pai, de avô, de namorado, de marido, de filho. Na minha família sempre foi assim. Se para a mãe a cozinha era uma tortura que se traduzia nos pratos que ela nos oferecia, as receitas do pai transformavam a segunda-feira mais ordinária em dia de luxo.

Mesa também é igual a aniversário. Muitos amigos, poucos amigos, só a família, um batalhão, depende da popularidade – ou da discrição – de quem comemora. Houve um tempo em que o aniversariante levava os convidados ao restaurante e pagava tudo para todos. Atualmente, só ganhando na Mega-Sena da virada. 

Uma coisa que me perturba nos aniversários em certos restaurantes é quando uma horda de garçons irrompe com velas acesas em um bolo, batendo palmas e cantando o Parabéns com o alcance vocal dos Três Tenores. Muito cliente já deve ter se engasgado com a costela nessa hora. Há o aniversariante que se constrange um pouco, há o que curte e se diverte. É o que importa. Quem tem que gostar é ele, não a vizinha chata da mesa ao lado.

Mesa é romance. Quanta simpatia não virou amor entre um risoto de funghi e um brownie com sorvete? Pedindo entrada e cafezinho, então, quantos não tiveram tempo de comprovar que gostariam de estar com a pessoa do outro lado da mesa pelo resto da vida? Dependendo da eternidade para a maquininha de cartão chegar, deu tempo até de planejar as reformas no apartamento dela, necessárias para quando a cadelinha dele, chamada Luna, mudar para lá com o dono.

É na mesa, também, que grandes negócios são fechados – mesmo que, na manhã seguinte, passado o efeito do vinho, a gente caia na realidade e desista de dar o peitaço que vai nos tirar de vez da vida de assalariados. Isso quando se está recebendo salário, claro. Não faz mal. Enquanto duraram os planos, apenas de pensar em não ver a cara do chefe todos os dias, todo mundo foi feliz. Mesa é, pois, felicidade. 

Mas mesa, óbvio, não é só delicadeza. O que se faz de tramoia e maracutaia em volta dela não é para amadores. Esses lautos jantares que o Temer oferece aos políticos da sua base em troca de apoio para isso e aquilo, por exemplo. Coitados daqueles aspirantes a vereador que ofereciam um sanduíche de apresuntado para quem votasse neles. 

Agora os menus são muito mais elaborados, sempre tem salmão e, de preferência, alguma receita com tapioca para conferir a brasilidade que a ocasião exige. Muitos dos candidatos que distribuíram sanduíches para o eleitorado foram escorraçados da política – e com razão – por más práticas.

Mas o que dizer do presidente que, na cara dura, enche a barriga dos parlamentares nos convescotes em que o prato principal somos todos nós? Nessas horas, parece que a única coisa a fazer é reunir quem se gosta em volta de uma mesa e ficar junto, bem junto. Pode que os problemas não desapareçam, mas que ajuda a unir forças para viver o ano que está chegando, ah, isso ajuda.

Por Claudia Tajes

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