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Edson Celulari: aos 60 anos e recuperado do câncer, ator revela detalhes sobre seu futuro no cinema

Filho de mãe gaúcha e pai paulista, Edson Celulari nasceu em uma família de quatro filhos. Ninguém havia sido artista antes dele. Começou a fazer teatro amador aos 15 anos, escondido do pai, que preferia ver os filhos com “diploma de doutor”.

“Um dia me foi pedido, na escola, que eu escrevesse um texto a respeito de qual faculdade eu faria”, narra Edson Celulari, com a elegância e a calma que lhe são peculiares. “Escrevi um monólogo, em que atuei e dirigi, para apresentar o trabalho no colégio. Convidei meu pai para assisti-lo ele, um homem muito simples, funcionário público. Depois da apresentação, ele olhou para mim e perguntou: ‘Meu filho, tem escola para isso?’ Eu respondi: ‘Tem sim, a Escola de Artes Dramáticas da USP’. Ele devolveu: ‘Você se inscreveu para Odontologia; Engenharia?’ Respondi que sim. ‘E para isso: Teatro?’. Respondi que sim também. Ele finalizou: ‘Você leva jeito para isso. Se você passar nos três, você escolhe’. Eu passei nos três, escolhi o teatro, e meu pai acompanhou minha carreira com muito prazer e muito orgulho”.

Homenageado no 46º Festival de Cinema de Gramado com o Troféu Oscarito, Edson Celulari, 60 anos, relembra, com emoção, seu início na carreira ligada ao cinema, ao teatro e à televisão. Na telona, Edson esteve em títulos como “Asa Branca, Um Sonho Brasileiro” (1981), “A Ópera do Malandro” (1985), “Diário de um Novo Mundo” (2006) e “Teu Mundo não Cabe nos Meus Olhos” (2016). Agora, depois de vencer o câncer e retornar à labuta com energia renovada, ele quer mais!

“Quero dirigir cinema, contar histórias com qualidade, que surpreendam, toquem, emocionem, entretenham”, adianta.

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Edson Celulari e seu Oscarito. Foto: Agência Gaúcha de Fotografia

 

Edson, qual é a sua referência de Oscarito o que ele representa para você como artista?

É o Romeu, que a Julieta é o Grande Otelo (risos)… O Oscarito é um grande exemplo! Com o Grande Otelo, eu tive o prazer de trabalhar em cinema e televisão. Uma vez, eu estava em Nova Iorque e teve a estreia do “Fitzcarraldo”, filme do qual Otelo participava. Em uma cena, uma locomotiva para no meio da Selva Amazônica e desce o condutor, personagem do Grande Otelo já um senhor, baixinho —, na cena, ele desce e diz apenas “Ai, ai…”. O cinema inteiro, meio sem entender, entrou no clima e exclamou junto. Aquilo mostrou a força dele como comediante, assim como a força que Oscarito tinha. Ambos são a história do cinema brasileiro! A memória que eu tenho são os dois, populares e com uma qualidade incrível de trabalho artístico, com muito de intuição e também de preparação. Fazer comédia, aparentemente, é mais fácil, mas há a precisão do timing, o controle físico para dar a informação correta. E esses atores e escolas mais antigas, da qual Oscarito fazia parte, cuidavam isso — sabiam muito bem o que estavam fazendo. É um honra receber um troféu que leva o nome dele!

E sua ligação com o cinema gaúcho? Você fez “Diário de um Novo Mundo”, do Paulo Nascimento…

Exatamente! Há 13 anos. O filme é lindo e muito bem produzido. Concorremos em Gramado, inclusive, ganhamos o Kikito de Melhor Roteiro. Mais recentemente, fiz “O Mundo Não Cabe nos Teus Olhos”. Eu tive a experiência recente de dirigir um curta-metragem chamado “Cinzas”, que rodei em Los Angeles e, por acaso, finalizei aqui no Sul também. Muita coisa me atrai para cá. Eu já tenho um novo projeto e esse eu quero dirigir que é uma história do Paulo Nascimento. Chama-se “Atlântico Pacífico”. Eu vejo o Sul do país como uma força cinematográfica, um polo muito representativo. Uma das provas disso é este festival! Venho aqui com o maior orgulho e vontade.

E do que trata “Atlântico Pacífico”?

Estou naquela fase de leitura do roteiro e determinando ainda algumas mudanças de narrativa com o Paulo. É uma história simples, de um pai e de uma filha, que viveram distantes pela separação do casal, e ele quer retomar, depois de alguns anos, a relação com essa adolescente. Ele propõe à filha que fizessem uma viagem do Atlântico ao Pacífico, passando pelo Uruguai, pela Argentina e pelo Chile. É uma tentativa desse pai deixar um legado para essa filha. Essa é a história! Um filme intimista um road movie de emoção e com umas passagens engraçadas. Mas ainda temos um roteiro muito largo! Estamos no trabalho de dissecar e depurar isso tudo.

O que o estimula e o que você espera encontrar atrás das câmeras?

São novos problemas (risos). Esses novos desafios são maravilhosos. Se a gente saísse de casa sabendo o que iria encontrar na esquina, nem sairíamos… A gente sempre espera encontrar o inesperado. Isso que nos atrai! Eu acho que dirigir um filme engloba uma responsabilidade em espaços diferentes do ator. Em uma responsabilidade de narrativa, há o diálogo com todas as frentes de criação, e isso me fascina! Eu não tenho nenhuma pretensão de criar um grande filme de linguagem nada disso. Eu, quando entro num set para realizar o meu trabalho de ator, a minha obrigação, o meu objetivo, é contar uma história. Eu continuarei tentando contar uma história na minha nova função obviamente com as responsabilidades adequadas a ela. Mas eu vou com entusiasmo! Sem medo, não vou sozinho, e sim com uma equipe inteira me apoiando, estudando roteiro. Chega na hora e tem coisas que eu preciso resolver ali, de improviso, e assim será. Tudo isso me fascina!

E quais histórias te interessam contar?

Não são diferentes das histórias que, como ator, gosto de interpretar. São histórias que toquem. O artista tem que ter um olhar para o mundo. A gente faz um conteúdo com o objetivo de atrair uma plateia maior ou menor, específica ou geral. O diretor também é assim e não fará nada disso sozinho. Ele é um líder: conduz um elenco, um fotógrafo, dirige uma equipe inteira, depois acompanha uma montagem… Eu quero contar histórias com qualidade, que surpreendam, que toquem, que emocionem e entretenham. E o cinema é muito mais complexo como produção. Há um tempo de gestação muito grande de uma ideia, que se torna a primeira versão de um roteiro, depois em várias versões, aí é preciso compor uma equipe… E depois daquele produto finalizado, como você vai distribuir e exibir? É uma dificuldade que todos nós sabemos e, daquela fatia, qual é a do produtor, que precisa pensar nos próximos filmes? A realidade do cinema é muito mais complexa do que a do teatro e da televisão. Mas sou um otimista. Diante desses fatos que vivemos agora, sejam políticos, sociais todos graves, enfim… Que a gente possa lutar ainda pela qualidade desses conteúdos que a gente tem, seja pelos “da tela grande” ou por outras mídias. Sempre vai existir espaço para um bom produto! É nisso que acredito.

Dar a volta por cima em problemas graves de saúde o estimula ainda mais a buscar novas frentes de atuação?

Você passar por um susto assim te dá a oportunidade de repensar uma porção de coisas. Primeiro, eu tive a chance de superar. Que bom! Muita gente não consegue. Eu consegui. Não é simples; é um susto; é a finitude. E você tem que encarar sem tempo de questionar “por que eu?”. Eu tive a sorte de ter um protocolo pronto e medicações. Você começa a perceber que, um dia, tudo tem um fim. Ter superado a doença, e aquele tempo de tratamento de seis, sete meses, me deu a oportunidade de refletir sobre coisas, sejam profissionais, pessoais tudo da vida. Criar prioridades. Você sai melhorado. Agora, eu quero é fazer e fazer. Aguardem-me!

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Edson Celulari e Karin Roepke. Foto: Agência Gaúcha de Fotografia

Por Andréa Lopes

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