Você é feminista e não sabe é um livro-projeto que a mim diz a que veio já pelo nome. Pelo acolhimento – a gente não tem de saber nada, ser militante ou ativista, entender de feminismo, de história ou de política, pode ter pontos de vistas diferentes, pode inclusive discordar. Há um espaço aberto para isso nos canais que o projeto tem e nos quais divulga, na íntegra, as entrevistas transcritas nesse livro. Elas estão disponíveis no Youtube e na página do Facebook. Porque nada aqui é estanque, tudo é movimento compartilhado, desde o início.

Mas vamos a este livro. Com lindas ilustrações gráficas e textuais, que nos pegam pelas mãos para passar as páginas, o Você é feminista e não sabe em papel nos provoca uma reflexão que parece ser óbvia, mas na verdade não o é. É sim uma reflexão complexa, urgente, tão sufocada e desfocada quanto necessária.

Desafia, de peito aberto, o político (claro, como poderia não ser) atributo do ingênuo. Não por acaso, ingênuo/a. Categoria a que mulheres estão tão acostumadas. Ingênua para isso, a que o homem supõe um elevado valor moral, ingênua para aquilo, a que o mesmo homem indica um desvalor profissional – num resumo simples e rasteiro das infinitas camadas que não vem ao caso eu discutir neste prefácio, este livro cava, com muito mais competência que possuo, essas questões.

Não há nada de ingênuo ou óbvio na reflexão que este livro de matizes, generoso e político – na genuína concepção – nos traz. Somente em uma sociedade na qual as igualdades de gênero, de etnia, de condição física, de classe social e de orientação sexual sejam incorporadas à legislação, estabelecidas como comportamento vigente e, sobretudo, respeitadas no cotidiano das comunidades e dos poderes instituídos, haverá condições de justiça e de prosperidade na mesma medida para todos. Esse é o fundamento do feminismo. E é isso que o Você é feminista e não sabe quer nos dizer, defender e, na luta, garantir. Que não seja preciso brigar por salários iguais.

Que não seja preciso dizer a um homem que o corpo de uma mulher, ou de uma menina, não lhe pertence, nunca, nem quando a menina quiser. Homens! Reajam!!!

Por Constança Guimarães

Digam não. Condenem seus amigos. Que a cor não seja uma questão, mas que a negra possa gritar até que não precise. Que a indígena seja respeitada e não usurpada em sua cultura. Que os trabalhos científicos das mulheres tenham os devidos créditos.

Que a história tenha valor de reparação na construção das políticas públicas. Que os homens saibam se calar e ouvir mais, saiam do palco a que estão tão acostumados e consigam ser parceiros efetivos e não protagonistas defensivos. Escuta ativa é uma demanda real e necessária.

Quem concorda com isso e defende esse modelo de sociedade, pode se entrincheirar na batalha. Sabendo-se feminista ou não (por enquanto). Esse é o convite generoso que este livro-projeto conclama, sem preconceito, de uma maneira inclusiva e inédita. Mas olha só, tem mais. O grande barato deste livro não é tudo isso, como se tudo isso dito antes fosse pouco. Você é feminista é não sabe é um livro único e genial, porque ele nos inclui no feminismo, como se fosse preciso, e se for preciso, por meio do conhecimento. É um documentário em letras, do ponto de vista das mulheres, sobre tudo.

Neste livro está escrito e desenhado aquilo que a gente não sabe e não ouviu falar com tanta densidade e clareza sobre vulva, estupro, vagina, mitologia, direitos da mulher, lesbianismo, maternidade, mulher no plenário da Câmara dos Deputados, racismo, sobre mulheres indígenas, transgênero, violência, direitos humanos, e felicidade, claro! Porque tem muita alegria e otimismo, sim senhora.

“O corpo humano é da pessoa”, diz Raquel Marques, presidenta da Associação Artemis. Esse é um ponto de partida incrível, que apenas o conhecimento nos dá.

Angélica Kalil consegue capturar e organizar, com rigor e sensibilidade, a história da mulher, absorvendo a perspectiva que cada entrevistada compartilha. E, a partir do relato de cada uma delas, nos entrega um novo parâmetro de compreensão sobre esse universo. Mariamma Fonseca, a ilustradora genial, transforma esses detalhes e nos apresenta em imagens o que não consigo descrever com palavras. Mariamma desenha um estatuto do feminismo.

É esse o grande barato deste livro, que a gente só entende quando vira página após página. A construção desse repertório emocionante da vida de fêmeas que somos e que não somos, mas que poderíamos ser e que podemos ser. A partir da leitura de cada uma delas e da gravura de cada uma que fica registrada em nossa memória para sempre.

Prefácio

Eu queria que a palavra feminismo – tão temida, agredida e ignorada – fosse melhor compreendida. Então, em 2015, comecei a fazer entrevistas sobre o tema que deram origem ao canal do Youtube Você é feminista e não sabe. A intenção era partir de diferentes recortes e propor reflexões sobre esta que é uma das grandes questões do nosso tempo.

As primeiras conversas feitas no canal estão agora neste livro lindamente ilustrado pela Mariamma Fonseca. Seu traço sensível e forte acrescentou informação, contextualização e afeto às histórias das mulheres. E materializou o conteúdo virtual da internet em um objeto, para mim, mágico.

Mágico, porque, ao conectar todas as falas, abre portas que a gente nem percebe que existem. E cada uma delas abre mais outra e mais outra. As palavras das entrevistas vão se encaixando nas fechaduras que fomos treinadas a não ver – mas que sempre soubemos existir.

Entrevistei pessoas de várias regiões do Brasil, vindas de diferentes culturas e trazendo bagagens de vida diversas. Serei para sempre grata por poder levar estes diálogos comigo. Frases inteiras que eu não esqueço. E que agora estão escritas aqui.

O Você é feminista e não sabe é resultado de um trabalho em conjunto que só consegui mover com o suporte de muitos amigos – em especial da Analu Buchmann, da Constança Guimarães e do Victor Dalla-Déa Takeda, que idealizaram comigo todo o projeto audiovisual e das redes sociais. E nunca me deixaram desistir de continuar.

O caminho do livro contou com a equipe da Café com Chocolate Design e suas sugestões bem-vindas. E com a Raíssa Pena, da plataforma de financiamento coletivo Catarse, que orientou e acreditou na nossa campanha de crowdfunding desde o início. Gostaria de fazer um agradecimento especial a todas e todos que apoiaram (seus nomes estão no final do livro) e nos ajudaram a levantar os recursos para a impressão destes exemplares – o Você é feminista e não sabe – entrevistas ilustradas também é de vocês.

Feminismo é uma palavra linda e que muda tudo.
Angélica Kalil
(Para minha filha Tarsila, o nome dela significa coragem.)
“Desenhar é levar uma linha para passear.” Paul Klee

O projeto Você é feminista e não sabe veio como um convite desafiador. Eu ainda era estudante de artes quando a Angélica Kalil depositou uma confiança em mim que nem eu mesma tinha. Criei um desenho para o canal do Youtube e após um bom tempo o projeto do livro com entrevistas ilustradas apareceu no meu colo. Com trabalhos caminhando junto com meus ideais, o livro se encaixava perfeitamente no modo que tenho encarado a vida. Mãe, baiana e feminista, cada frase dita por essas mulheres incríveis veio como inspiração e combustível para a luta pela igualdade de gênero.

As ilustrações encontradas aqui foram todas desenhadas à mão e depois passadas para o computador para colorir e serem tratadas. Procuramos alcançar a diversidade da mulher e representações femininas que fugissem do estereótipo. É importante pensar que cada leitora se sinta representada.

Ilustrar é também completar a informação do texto. Cada desenho caminha junto das falas, como quem anda de mãos dadas. Dizem que, quando olhamos uma imagem, “entramos” primeiro pelo olhos da figura.

A mistura de cor fez surgir na capa uma mulher verde-azul que te encara como quem diz: “bem lá dentro de você existe uma pessoa com sede de mudança e ela é feminista”. Neste livro, você entra pelos olhos, mas também passa pelo coração e alma de cada história.

Que elas possam inspirar vocês.
Mariamma Fonseca
(Para Iara)

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