Mesmo com eclipse superpower total do sol e mercúrio retrógado em Áries, abril já vem encostando mais sereno por aqui nos meus pagos. É só dia 8, ops 9, quase 12… é que me arrasto por esse texto há dias. Espiando os perfis de quem entende dos trânsitos planetários, vi que o momento pede recolhimento, sugere prudência e resguardo. Nada de novos projetos, investimentos voluptuosos, decisões definitivas ou assinatura de contratos. Pelo menos até o dia 25.   

A minha ideia era ter terminado de escrever essa crônica que comecei no domingo, no Dia do Jornalista, comemorado em 7 de abril. Viver da escrita e das histórias alheias é tão sedutor como aflitivo. A gente entra e sai (ou não sai jamais…) da vida e de momentos marcantes de muita gente, em muitos casos até da história.  

Fatos e situações me tocam (sempre) e poderiam ter me feito sentar e escrever nos últimos três meses. O verão que é sempre tão livre, excitante e inspirador, o Dia da Mulher, o colorido surreal e constrangedoramente metafórico mundo admirável de Bella Baxter e sua coleção sem fim de pobres criaturas, o aniversário de Porto Alegre… Até a procrastinação, tema e dilema sempre tão recorrente. Aqui em casa as águas de março não foram mansas. Amigas e amigos queridos brindando mais um ano de vida ou se despedindo dolorosamente dos seus primeiros e grandes amores, os pais. Muito trabalho, pilas curtos, zero viagens à vista, projetos e cabelos novos. Decidida, antes de passar a tesoura, comentei com um amigo no whatsapp e ele imediatamente reagiu: “Ah não, não corta!” Devolvi e (pensei): “(Grrrrrr, agora que) Eu vou cortar sim. Cansei de ser igual. Só mudei três vezes na vida.” Ele, que também não é de se entregar, insistiu: “Faz um coquinho”. Como adoro rir, foi bem melhor do que responder.

Noutro grupo, uma amiga também escreveu: “Ah, bem que tu faz, chega uma idade a gente tem que cortar o cabelo de tanto calor.” Eu quase voei na jugular dela, mesmo sabendo que era mais uma força de expressão e deixei claro de uma vez por todas: “Não é idade. Vou cortar o cabelo porque preciso de coragem em 2024 e quero treinar”. Era isso. Quero treinar a minha coragem para encarar esse e os outros anos que avançam cada vez mais velozes e furiosos na cara da gente. E quem só teve coragem duas vezes na vida (agora 3) de trocar o comprimento do cabelo, precisa de algum treino, não concordam? Tenho medo de altura, não sou adepta aos esportes radicais, preciso ser criativa nas minhas coragens. Se março foi quente e acachapante, no segundo dia do até então pacato abril, já tomei um buleo voltando do Prêmio Açorianos de mãos vazias. Siiiimmmm eu que ando quase só de tênis e rasteirinhas, apareci de salto alto e abanando o ego na premiação e por algumas horas até esqueci que o importante é competir e ser finalista já é um baita prêmio e blá blá blá. Verdade. Mas todo mundo quer ganhar, né? E assim é, como muita coisa na vida da gente. Todo mundo sente, pouca gente pensa e quase ninguém tem coragem de falar. Quer ver? Ser traída é ruim em qualquer circunstância. Levar um fora não fica atrás, mandar mensagem e ficar no vácuo também irrita bastante. Tudo passa. Eu acordo muitas vezes desanimada, mas gosto bastante da minha vida, embora eu não seja nem tão empoderada, nem tão bonita e nem tão feliz como (a)pareço no Instagram. Me questiono se sou uma boa mãe. Você, eu não sei, mas ando olhando mais o celular do que lendo. E os nossos filhos também, isso é certo. Aliás, o suicídio foi a quarta causa de morte entre jovens brasileiros entre 15 e 29 anos em 2019, segundo a OMS. A pandemia piorou esses números. Se nos falta estrutura para seguirmos saudáveis no ambiente hostil que é o mundo digital, imagina para quem ainda não formou a personalidade. A nossa liberdade termina quando invade a do outro. Isso não é censura, é mais velho que andar para frente e todo mundo aprende desde criancinha. Fui clara ou vou ter que cortar o cabelo de novo?   

Mariana Bertolucci

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    1. Emílio says:

      Clássica canceriana! Emily de cabelos novos. Incrível como essa mulher faz de uma tesoura uma crônica sobre sua própria existência! Pensando bem, não é tão incrível assim: basta ter talento, sensibilidade e saber ler a vida. Isso ela tem de sobra.

    1. Alcimir Richter says:

      Mariana excelente texto! Muito tu! Muito verdadeiro com muitas verdades de nosso atual “momento moderno”.
      As reflexões são a melhor maneira de trazer o EU e fazer com que o interlocutor reflita.
      Parabéns sempre querida amiga e madrinha da escrita.
      Bj grande ❤️

    2. Alcimir Richter says:

      Mariana excelente texto! Muito tu!com muitas verdades de nosso atual “momento moderno”.
      As reflexões são a melhor maneira de trazer o EU e fazer com que o interlocutor reflita.
      Parabéns sempre querida amiga e madrinha da escrita.
      Bj grande ❤️

  1. João Satt says:

    Eu achei o texto uma delícia. As palavras correm soltas, e vão como um lego se encaixando com perfeição orgânica. Assumir as vulnerabilidades nos torna gigantes em uma terra de egos inflados, de seres incansavelmente + q perfeitos.
    Esse estado de “tensão e alívio” que silenciosamente nos quase enlouquece faz parte: a
    jornada da vida perfeita, exaure.
    Parabéns Mari, lindo de ver tuas fragilidades se transformando em potentes faróis que acalmam e abraçam todos nós!

  2. Chris Schmitt says:

    Mari, comecei a ler atraída pelas previsões astrológicas do pessoal de Áries e fui indo, indo, indo … envolvida, como sempre, no teu pensamento. A vida é isso aí, amiga, tu sabes como poucos vivê-la e contá-la para a gente. O maior prêmio é o nosso, poder te ler!

  3. Tanit Álvares Bezerra says:

    Texto 🔝 prima. Também tomei coragem e fui radical, dos cachos nem tão longos assim ao curtinho bem verão celebrando a idade e vida renovada e vamos em frente, um dia de cada vez!

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